sexta-feira, 19 de novembro de 2010

Universidade Mackenzie: Em Defesa da Liberdade de Expressão Religiosa

A Universidade Presbiteriana Mackenzie vem recebendo ataques e críticas por um texto alegadamente “homofóbico” veiculado em seu site desde 2007. Nós, de várias denominações cristãs, vimos prestar solidariedade à instituição. Nós nos levantamos contra o uso indiscriminado do termo “homofobia”, que pretende aplicar-se tanto a assassinos, agressores e discriminadores de homossexuais quanto a líderes religiosos cristãos que, à luz da Escritura Sagrada, consideram a homossexualidade um pecado. Ora, nossa liberdade de consciência e de expressão não nos pode ser negada, nem confundida com violência. Consideramos que mencionar pecados para chamar os homens a um arrependimento voluntário é parte integrante do anúncio do Evangelho de Jesus Cristo. Nenhum discurso de ódio pode se calcar na pregação do amor e da graça de Deus.

Como cristãos, temos o mandato bíblico de oferecer o Evangelho da salvação a todas as pessoas. Jesus Cristo morreu para salvar e reconciliar o ser humano com Deus. Cremos, de acordo com as Escrituras, que “todos pecaram e carecem da glória de Deus” (Romanos 3.23). Somos pecadores, todos nós. Não existe uma divisão entre “pecadores” e “não-pecadores”. A Bíblia apresenta longas listas de pecado e informa que sem o perdão de Deus o homem está perdido e condenado. Sabemos que são pecado: “prostituição, impureza, lascívia, idolatria, feitiçaria, inimizades, contendas, rivalidades, iras, pelejas, dissensões, heresias, invejas, homicídios, bebedices, glutonarias” (Gálatas 5.19). Em sua interpretação tradicional e histórica, as Escrituras judaico-cristãs tratam da conduta homossexual como um pecado, como demonstram os textos de Levítico 18.22, 1Coríntios 6.9-10, Romanos 1.18-32, entre outros. Se queremos o arrependimento e a conversão do perdido, precisamos nomear também esse pecado. Não desejamos mudança de comportamento por força de lei, mas sim, a conversão do coração. E a conversão do coração não passa por pressão externa, mas pela ação graciosa e persuasiva do Espírito Santo de Deus, que, como ensinou o Senhor Jesus Cristo, convence “do pecado, da justiça e do juízo” (João 16.8).

Queremos assim nos certificar de que a eventual aprovação de leis chamadas anti-homofobia não nos impedirá de estender esse convite livremente a todos, um convite que também pode ser recusado. Não somos a favor de nenhum tipo de lei que proíba a conduta homossexual; da mesma forma, somos contrários a qualquer lei que atente contra um princípio caro à sociedade brasileira: a liberdade de consciência. A Constituição Federal (artigo 5º) assegura que “todos são iguais perante a lei”, “estipula ser inviolável a liberdade de consciência e de crença” e “estipula que ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa ou de convicção filosófica ou política”. Também nos opomos a qualquer força exterior – intimidação, ameaças, agressões verbais e físicas – que vise à mudança de mentalidades. Não aceitamos que a criminalização da opinião seja um instrumento válido para transformações sociais, pois, além de inconstitucional, fomenta uma indesejável onda de autoritarismo, ferindo as bases da democracia. Assim como não buscamos reprimir a conduta homossexual por esses meios coercivos, não queremos que os mesmos meios sejam utilizados para que deixemos de pregar o que cremos. Queremos manter nossa liberdade de anunciar o arrependimento e o perdão de Deus publicamente. Queremos sustentar nosso direito de abrir instituições de ensino confessionais, que reflitam a cosmovisão cristã. Queremos garantir que a comunidade religiosa possa exprimir-se sobre todos os assuntos importantes para a sociedade.

Manifestamos, portanto, nosso total apoio ao pronunciamento da Igreja Presbiteriana do Brasil publicado no ano de 2007 e reproduzido parcialmente, também em 2007, no site da Universidade Presbiteriana Mackenzie, por seu chanceler, Reverendo Dr. Augustus Nicodemus Gomes Lopes. Se ativistas homossexuais pretendem criminalizar a postura da Universidade Presbiteriana Mackenzie, devem se preparar para confrontar igualmente a Igreja Presbiteriana do Brasil, as igrejas evangélicas de todo o país, a Igreja Católica Apostólica Romana, a Congregação Judaica do Brasil e, em última instância, censurar as próprias Escrituras judaico-cristãs. Indivíduos, grupos religiosos e instituições têm o direito garantido por lei de expressar sua confessionalidade e sua consciência sujeitas à Palavra de Deus. Postamo-nos firmemente para que essa liberdade não nos seja tirada.

Este manifesto é uma criação coletiva com vistas a representar o pensamento cristão brasileiro. Para ampla divulgação.

sábado, 30 de outubro de 2010

Jonathan Edwards- Ver e Sentir Deus em Todas as Areas do Conhecimento.

A tarefa dos estudiosos cristãos é estudar a realidade como manifestação da glória de Deus, falar dessa realidade com exatidão e sentir a beleza de Deus presente nela. Creio que Edwards consideraria uma enorme abdicação da erudição o fato de tantas obras acadêmicas cristãs fazerem tão pouca referência a Deus. Se todo o universo e tudo que há nele existem em função do desígnio de um Deus infinito e pessoal, com o propósito de tornar a sua glória multiforme conhecida e amada, tratar de qualquer assunto sem se referir à glória de Deus não é erudição, mas sim rebelião.

Além disso, a exigência é ainda maior: a erudição cristã deve ser imbuída do sentimento espiritual pela glória de Deus em todas as coisas. A maioria dos estudiosos sabe que, sem o apoio da verdade, os sentimentos se transformam em emocionalismo infundado. Porém, não são muitos os estudiosos que reconhecem o oposto: sem despertar os verdadeiros sentimentos espirituais é impossível ver a verdade integral em todas as coisas.

Assim, Edwards diz: "Onde há um tipo de luz sem calor, uma mente repleta de conceitos e especulações, com um coração frio e intocado, não pode haver coisa alguma de caráter divino nessa luz, esse conhecimento não é o verdadeiro conhecimento espiritual das coisas divinas".

Há quem possa objetar, afirmando que a psicologia, a sociologia, a antropologia, a história, a física, a química, o idioma e as ciências da computação não são "coisas divinas", mas sim "coisas naturais". Essa idéia, porém, deixa de fora a primeira questão: a fim de vermos a realidade como ela é de fato, devemos vê-la em relação ao Deus que a criou, que a sustenta e lhe dá todas as propriedades que possui e todas as suas relações e propósitos. Ver todas essas coisas em cada disciplina é ver "as coisas divinas" - e, no final, são elas que importam. Portanto, Edwards afirma que não podemos divisar essas coisas e, por conseguinte, não podemos exercitar a erudição cristã, se não tivermos uma percepção espiritual ou um gosto por Deus - se não tivermos a capacidade de captar a beleza de Deus naquilo que ele criou.De acordo com Edwards, essa percepção é dada por Deus por meio do novo nascimento sobrenatural, realizado pela Palavra de Deus. "O primeiro efeito do poder de Deus sobre o coração na regeneração é dar ao mesmo uma percepção divina ou uma inclinação por Deus, levando o coração a se deleitar com a beleza e a doçura da excelência suprema da natureza divina."52 Portanto, a fim de exercitar a erudição cristã, a pessoa deve ser nascida de novo; ou seja, a pessoa não deve apenas observar os efeitos da obra de Deus, mas também se deleitar com a beleza encontrada na natureza de Deus.

Edwards afirma que o trabalho racional não é em vão, mesmo considerando-se que tudo depende do dom gratuito de Deus da vida e da visão espiritual. Isso porque "quanto mais a pessoa possuir conhecimento racional das coisas divinas, mais oportunidade terá, quando o Espírito for soprado no seu coração, de ver a excelência dessas coisas e sentir a sua doçura".

Fica claro que, ao falar de "conhecimento racional", Edwards não está se referindo ao racionalismo que exclui filosoficamente as "coisas divinas". Em se tratando da erudição cristã, é ainda mais relevante o fato de que, para Edwards, o "conhecimento racional" também exclui uma imitação metodológica, por parte dos cristãos, do racionalismo encontrado nas obras acadêmicas. Creio que Edwards consideraria uma parte da erudição cristã de hoje metodologicamente ininteligível em função da exclusão de fato de Deus e de sua Palavra dos processos de raciocínio. Ao que parece, esse tipo de erudição pode ser atribuído ao desejo de obter o reconhecimento e a aceitação dos meios acadêmicos em geral. No entanto, o preço a ser pago por esse respeito é extremamente alto. E acredito que Edwards questionaria se, a longo prazo, essa transigência não acabará por enfraquecer a influência cristã que visa à exaltação de Deus, uma vez que a concessão ao naturalismo fala mais alto do que o objetivo da supremacia de Deus em todas as coisas. Não apenas isso, mas também a própria natureza da realidade será distorcida por estudiosos que adotam uma metodologia que não prioriza o fundamento, a força e o objetivo da verdade, ou seja, Deus. Sempre que Deus é metodologicamente deixado de lado, torna-se impossível interpretar a realidade com precisão.

De que maneira, então, esse conceito de erudição cristã é resultante da verdade de que a demonstração da glória de Deus e a alegria mais profunda da alma humana são a mesma coisa? Deus demonstra a sua glória na realidade criada que está sendo investigada pelo estudioso (SI 19.1; 104.31; Cl 1.16,17). E, no entanto, o propósito de Deus ao fazer essa demonstração não é cumprido se o investigador não a observa e sente. Assim, a experiência, a satisfação e o prazer do estudioso com a beleza da glória de Deus são uma ocasião em que a demonstração dessa glória é consumada. Nesse momento, as duas coisas se tornam uma só: o engrandecimento da glória de Deus é concretizado na observação e na experiência que ocorre na mente e no coração do estudioso. Quando o eco da glória de Deus repercute nas afeições do estudioso consagrado a Deus e ressoa no que ele diz e escreve, o propósito de Deus para a erudição é cumprido.

John Piper
Fonte:http://www.jonathanedwards.com.br

domingo, 3 de outubro de 2010


Como devemos proceder diante da soberania de Deus?


Deus é soberano e opera de acordo com seu plano eterno na salvação do seu povo. A vontade dos homens não escolhe naturalmente a Deus porque está inclinada para o mal. Somente Deus pode fazer que uma pessoa deseje ser salva dos seus pecados. Ele é o Deus soberano, Ele é o grande Rei. Se acreditamos nisso, como devemos então reagir?

Primeiro, já que Deus é soberano, devemos temê-lo. Temer a Deus significa lembrar quão grande, santo e poderoso é Deus. Significa também lembrar quão pequenos, pecaminosos e fracos somos nós. Significa fazer a Sua vontade e crer tudo o que Ele nos diz em Sua Palavra.

Significa obedecer a Deus porque dependemos totalmente dEle. Deus nos dá tudo o que precisamos e por isso, o menos que podemos fazer é obedecê-Lo no que Ele diz na Bíblia e Lhe dar o primeiro lugar em tudo.

Segundo, como Deus é soberano devemos aceitar com gosto todo o que nos acontece. Podemos queixar-nos quando não temos o que desejamos, o podemos sentir que merecemos alguma bênção em particular.

Talvez sintamos que merecemos o êxito ou a felicidade. Mas se somos crentes verdadeiros, sabemos que Deus não nos dá o castigo que os nossos pecados merecem. Os crentes verdadeiros percebem que, em vez de punir-nos, Deus tem sido muito bondoso para conosco em todos os aspectos, quando merecíamos o contrário. E se realmente acreditamos que Deus é soberano em tudo, então devemos reconhecer que Ele tem o direito de fazer o que Lhe apraz com o que é dEle, inclusive conosco.

Portanto, se Deus faz com que nos aconteçam coisas de que não gostamos, devemos aceitá-las sabendo que provêm de sua mão, e que Ele procura somente o nosso bem.

Terceiro, já que Deus é soberano, sempre devemos estar agradecidos a Ele. Sentimos-nos agradecidos quais as coisas vão de acordo ao que desejamos, mas também deveríamos louvá-Lo e Lhe dar graças quando nos parece que tudo vai mal. Deveríamos ser gratos ainda em tempos difíceis, porque se somos crentes verdadeiros, acreditamos que Deus nos tem escolhido, que nos ama e que está controlando todo o que nos acontece.

Se realmente somos crentes, devemos seguir o exemplo de nosso Senhor Jesus Cristo. Você percebeu quão temeroso era Jesus de desde o Pai, aceitando Sua vontade e dando-Lhe graças em todo momento? No Novo Testamento vemos que quando Satanás o tentou, Jesus lhe disse que somente Deus devia ser adorado. Ao longo do Novo Testamento vemos a obediência de Cristo, até que sua obediência culminou em sua morte em favor do povo escolhido de Deus. Jesus aceitou a vontade do Pai ainda e quando pediu que, se possível, o Pai eliminasse os seus sofrimentos.

Ele também disse: "Não seja feita a minha vontade, senão a Tua". Também vemos como Cristo dava graças ao Pai. Ainda quando a gente que tinha visto os seus milagres não se arrependeu nem acreditou nEle, Jesus todavia dava graças a Deus. Como Lucas disse: "Naquela mesma hora se alegrou Jesus no Espírito Santo, e disse: Graças te dou, ó Pai, Senhor do céu e da terra, que escondeste estas coisas aos sábios e inteligentes, e as revelaste às criancinhas; assim é, ó Pai, porque assim te aprouve" (Lucas 10:21). Seguramente, se nós somos crentes verdadeiros em Cristo Jesus faremos o mesmo.

Finalmente, já que Deus é soberano, devemos adorá-Lo. Ele usa seu poder sabiamente e para benefício de seu povo. Devido a que Deus é completamente sábio, não pode cometer nenhum erro; porque Ele é santo, também não fará mal nenhum. Se não conhecêssemos mais sobre Deus, exceto que a Sua vontade é soberana, então somente teríamos medo dEle. Porém, podemos regozijar-nos porque sabemos que a poderosa e imutável vontade de Deus é também inteiramente boa.

O propósito divino de controlar tudo é mostrar a Sua própria santidade, bondade e verdade. A pesar de quanto vejamos no mundo, Deus ainda está executando os seus propósitos. E para realizar isso, em algumas ocasiões usa até os homens malvados e a Satanás. Ninguém pode alterar o propósito de Deus. Para Sua própria glória, Deus controla todo porque quer mostrar-nos Sua bondade, santidade e verdade. Para Sua própria glória, Deus o Pai escolheu uma grande número de pessoas para serem salvos de seus pecados. Jesus Cristo morreu por estas pessoas e o Espírito Santo lhes dá a vida espiritual.

Para mostrar Sua glória, Deus muda a natureza malvada das pessoas escolhidas para salvação, a fim de que se voltem para Ele e aprendam a amá-Lo.

Esta obra maravilhosa de Deus está acontecendo atualmente em todas partes do mundo. Muitos dos que lerão estas palavras são aqueles que Deus têm chamado para que sejam Seu povo. Ele os mudou, e tem lhes dado vida espiritual a fim de que chegassem a ser Seu povo. Se você deseja que este Deus seja o seu Deus, então busque-O em oração. Ele tem prometido e não lançará fora a ninguém que venha até Ele. Naturalmente que não os lançará fora, porque é a mesma obra dEle em seus corações a que lhes faz desejar acudir a Ele.

Todas as coisas foram feitas por Deus, todas as coisas são controladas por Ele. Todas as coisas operam de acordo ao seu plano. Todas as coisas servem para a glória de Deus, e quando todas as coisas cheguem ao seu fim, este Deus soberano permanecerá por sempre sendo adorado e louvado em toda a Sua bondade, santidade e glória. Vamos então a louvar e adorar o nosso soberano e Todo Poderoso Deus, aqui e agora.

Grande Deus! Quão infinito és Tu,
Quão débeis e indignos vermes somos nós!
Prostre-se toda criatura e busque a salvação de ti.
A eternidade com todos seus anos
Permanece sempre presente a Tua vista,
Para Ti não existe nada velho, Grande Deus!
Não pode haver nada novo para Ti.
As nossas vidas são movidas de um lado a outro,
E angustiadas por coisas que não têm importância;
Enquanto Teu eterno pensamento segue adiante,
Segundo o Teu imutável e inalterável plano.

Isaac Watts (1674-1748).


Extraído do site:
http://www.eleitosdedeus.org/

sábado, 25 de setembro de 2010

Calvino e as novas revelações

Os fanáticos, pondo de lado a Santa Escritura, passam por cima da revelação e subvertem todos os princípios da piedade



Apelo dos Fanáticos ao Espírito em prejuizo da Escritura

Além disso aqueles que repudiam as Escrituras, imaginando que podem ter outro caminho que o leve a Deus, devem ser considerado não tanto como dominados pelo erro, mas como tomados por violenta forma de loucura. Recentemente, apareceram certos tipos de mau caráter que atribuindo a si mesmos, com grande presunção, o magistério do Espírito, faziam pouco caso de toda leitura da Bíblia, e riam-se da simplicidade dos que ainda seguem o que esses, de mau caráter, chamam de letra morta e que mata.

Eu gostaria de saber deles, porém, que Espírito é esse por cuja inspiração eles são levados a alturas sublimadas, a ponto de terem a ousadia de desprezar, como infantil e rasteiro, o ensino da Escritura. Se eles responderem que é o Espírito de Cristo quem os inspira, consideramos absurdamente ridículo esse tipo de certeza uma vez que eles, se concordam, como penso que o fazem, que os Apóstolos de Cristo e todos os fiéis, na Igreja Primitiva, foram iluminados por esse mesmo Espírito. O fato é que nenhum dos Apóstolos ou fiéis aprenderam desse Espírito a desprezar a Palavra de Deus. Ao contrário, cada um deles foi antes tomado de profunda reverência (para com a Escritura), como seus escritos o comprovam muito luminosamente. Na verdade, assim foi predito pela boca do Isaías, pois o Profeta não cerca o povo antigo com um ensino meramente externo, como se fosse para o povo como as primeiras letras, mas diz: "O meu Espírito que está sobre ti, e as minhas palavras que pus na tua boca, não se desviarão da tua boca nem da boca tua descendência..." (Is 59.21), considerando antes que a nova Igreja terá, sob o reino de Cristo, a verdadeira e plena felicidade, que consiste em ser regida pela voz de Deus, não menos que pelo seu Espírito. Concluímos daqui que esses fanáticos cometem abominável sacrilégio quando separam estes dois elementos que o Profeta uniu por meio de um vínculo inviolável.

A isto, acrescente-se que Paulo, não obstante ter sido arrebatado até o terceiro céu (II Co 12.2) - não deixou, entretanto, de aproveitar o ensino da Lei e dos Profetas, exortando também a Timóteo - mestre de projeção singular - a que se dedicasse à sua leitura (1 Tm 4.13). É também digno de ser lembrado aqui o que Paulo diz da Escritura: "Que ela é útil para ensinar, admoestar, redargüir, para que os servos de Deus se tornem perfeitos" (II Tm 3.16). Não será, portanto, diabólica loucura imaginar como transitório ou temporário o valor da Escritura, destinada a conduzir os filhos de Deus até a perfeição final?

Quero que esses fanáticos me respondam também o seguinte: Terão eles bebido de outro Espírito e não daquele que o Senhor prometeu aos seus discípulos? Ainda que estejam possuídos de loucura tão extrema, não os considero contudo, arrebatados de tão furiosa demência a ponto de terem a ousadia de gabar-se disso. Mas, ao prometer o Espírito, de que natureza declarou ele haver de ser esse Espírito? Na verdade, era um Espírito que não falaria por si mesmo, mas, ao contrario, sugeriria a mente deles e nela instilaria aquilo que ele mesmo, Jesus, havia transmitido por meio da Palavra (Jo 16.13). Portanto, não é função do Espírito que Cristo nos prometeu desvendar novas e indizíveis revelações, ou forjar novos tipos de doutrina, pelos quais sejamos desviados do ensino do Evangelho já recebido. Ao contrario, a função do Espírito é a de selar, na nossa mente, a mesma doutrina que o Evangelho nos recomenda.

A Bíblia é o Árbitrio do Espírito
Se ansiamos obter algum uso e fruto da parte do Espírito de Deus, podemos entender facilmente como é imperioso para nós aplicar-nos, com grande diligência, tanto a ler quanto a ouvir a Escritura. É por isso que Pedro até louva (II Pe I.19) o zelo dos que estão atentos ao ensino profético, ensino que, todavia, depois de começar a brilhar a luz do Evangelho poderia parecer ter perdido a validade. Muito ao contrário, se algum espírito, desprezando a sabedoria da Palavra de Deus, nos impõe outra doutrina, devemos suspeitar com justa razão, de que seu ensino é vaidade e mentira (Gl. 1:6-9).

Sim, porque se Satanás se transforma em anjo de luz (II Co 11.14), que autoridade poderá ter o Espírito entre nós, se não soubermos discerni-lo por meio de sinal de absoluta certeza? E muito claramente a voz do Senhor no-lo tem apontado, mas esses infelizes (embusteiros) tudo fazem por extraviar-se, buscando a própria ruína, quando buscam o Espírito por si mesmos, ao invés de busca-lo por ele próprio.

Alegam eles que é ofensivo ao Espírito de Deus - a quem tudo deve estar sujeito -, ficar subordinado a Escritura. Como se fosse, na verdade, repulsivo ao Espírito Santo ser igual a si mesmo, por toda parte, ou permanecer de acordo consigo mesmo em todas as coisas, e em não variar em coisa alguma! De fato, se fôssemos obrigados a julgar de acordo com a norma humana, angélica ou estranha, então poder-se-ia considerar o Espírito como reduzido à subordinação, e até a servidão, se se preferir. Quando, porém comparamos o Espírito consigo mesmo, e em si mesmo o consideramos, quem poderá dizer que, com isso, o estejamos ofendendo?

Confesso que o Espírito, desse modo, é submetido a um exame através do qual Ele quis fosse estabelecida a sua majestade entre nós. Ele deve ficar plenamente manifestado a nós tão logo entre no nosso coração. No entanto, para que o Espírito de Satanás não nos persuada em nome do Espírito Santo, este quer ser reconhecido por nós na imagem que imprimiu de si mesmo nas Escrituras, pois sendo ele mesmo o autor da Escritura, não pode variar nem ser inconstante consigo mesmo. Portanto, do modo como nelas se manifestou, tem de permanecer para sempre. Isto não pode ser modificado, a menos que julguemos - como dignificante -, o Espírito abdicar e degenerar de si mesmo!

A Bíblia e o Espírito não se separam
Quando a acusação que fazem contra nós, de que nos apegamos demasiadamente à letra que mata, acabam eles incorrendo na pena de desprezarem a Escritura. Ora, salta aos olhos o fato de Paulo (II Co 3.6), estar contendendo com os falsos apóstolos os quais, insistindo na Lei separada de Cristo, estavam, na realidade, alienando o povo da Nova Aliança, na qual o Senhor prometeu que haveria de gravar a sua Lei nas entranhas dos fiéis, e imprimi-la no coração deles (Jr. 31:33), Portanto, a letra está morta e a Lei do Senhor mata a seus leitores, guando não apenas se divorcia da graça de Cristo, mas, também, não tocando o coração, atinge só os ouvidos. Se ela, porém, por meio do Espírito, se imprime de modo eficaz nos corações e manifesta a Cristo, ela é a Palavra da vida (Fl. 2:16), que converte as almas e da sabedoria aos símplices (Sl. 19:7).

Além disso, nessa mesma passagem (II Co 3.8), Paulo chama a sua pregação de ministério do Espírito, querendo dizer com isso, sem dúvida, que o Espírito Santo de tal modo se prende à sua verdade expressa na Escritura, nela manifestando e patenteando o seu poder, que nos leva a reconhecer na Palavra a devida reverência e dignidade. E isto não contradiz o que foi dito pouco atrás quando afirmamos que a Palavra não é absolutamente certa para nós, se não for confirmada pelo testemunho do Espírito, visto que o Senhor uniu entre si - como se fosse por mútua ligação -, a certeza de sua Palavra e a certeza do seu Espírito, de maneira que a firme religião da Palavra seja implantada em nossa alma, quando brilha o Espírito, fazendo-nos contemplar a face de Deus. Do mesmo modo, reciprocamente, abraçamos ao Espírito sem nenhum temor ou engano, quando o reconhecemos na sua imagem ou, seja, na Palavra! E, de fato, é assim!

Deus não deu a Palavra aos homens tendo em vista uma apresentação passageira, que fosse abolida assim que viesse o seu Espírito. Ao contrário enviou-nos o mesmo Espírito por meio de cujo poder nos deu a Palavra, com o fim de realizar a sua obra, confirmando eficazmente a mesma Palavra. Por isso, Cristo abriu o entendimento dos dois discípulos de Emaús (Lc 24.27, 45), não para que, pondo de lado as Escrituras, esses discípulos se fizessem sábios a si mesmos, mas para que fossem capazes de entender essas Escrituras. Igualmente Paulo, quando exorta os cristãos de Tessalônica (I Ts 5.19-20) a não extinguirem o Espírito, não os eleva as altura com vãs especulações fora da Palavra, mas acrescenta imediatamente que não se deveriam desprezar a profecias. Com isso, o Apóstolo diz, de maneira não duvidosa, que quando se desprezam as profecias, a luz do Espírito fica obscurecida.

Que dirão a respeito destas coisas esses fanáticos que consideram com validas apenas esta iluminação, desprezando e dizendo adeus a Divina Palavra, sem qualquer preocupação? Não menos confiantes e temerários são eles quando se agarram ambiciosamente a qualquer coisa que conceberam enquanto dormiam! Aos filhos de Deus, certamente, convém sobriedade bem diferente, pois eles, ao mesmo tempo que, sem o Espírito, se sentem privados de toda verdadeira luz, não ignoram, todavia, que a Palavra é o instrumento pelo qual o Senhor concede aos fiéis a iluminação do seu Espírito. Os fiéis não conhecem outro Espírito senão aquele mesmo Espírito que habitou nos Apóstolos e falou através deles, e desses oráculos os fiéis são continuamente convocados a ouvir a Palavra.

Extraído de João Calvino, As Institutas da Religião Cristã - Livro I, Capítulo 9

sábado, 28 de agosto de 2010

Os Cinco Pontos das Igrejas Batistas Reformadas
David Charles


Batista Reformado? O que é isso? Um batista que está se recuperando de alguma coisa? Batistas não podem ser reformados! Igrejas Batistas Reformadas são uma novidade e, portanto, não são confiáveis. No que exatamente os batistas reformados acreditam? O que exatamente é uma igreja Batista Reformada?

Esses tipos de perguntas e declarações são comuns nestes dias. A maioria dos pastores batistas reformados têm que lidar com tais sentimentos de forma regular.

O Cabeça da Igreja tem sido generoso com o evangelicalismo americano nos últimos anos. O Calvinismo parece estar desfrutando de um pequeno reavivamento. Conferências, livros e pregadores de destaque abundam. Alegre-se Sião!

Entretanto, isso não veio sem causar um pouco de consternação ao nosso pequeno grupo de igrejas; nós somos freqüentemente deturpados por aqueles que sabem o que foi a Reforma, e mal compreendidos por aqueles que não sabem. Na maior parte do tempo, isso não é difícil de suportar. É nosso privilégio poder explicar o que nós acreditamos e por que é tão importante para nós.

O real desafio para nós é quando uma igreja que tem pouco em comum conosco além dos chamados "Cinco Pontos do Calvinismo" ainda assim reivindica ser uma Igreja Batista Reformada. Observe que estes irmãos podem rejeitar o Princípio Regulador do Culto como antiquado, a Lei é menosprezada como sendo penosa, a observância do Sabbath é considerada legalista ou a teologia do pacto é comprometida com uma adesão ao dispensacionalismo. Eu gostaria de ver um pouco de honestidade nos anúncios.

Em uma tentativa de ajudar a explicar no que nós acreditamos, ofereço os CINCO PONTOS DAS IGREJAS BATISTAS REFORMADAS.

Estes não são completamente originais. Eu os ouvi pela primeira vez de Richard Barcellos que por sua vez os ouviu do Pastor Greg Nichols. Adicionei os sub-pontos e modifiquei alguns dos termos dos pontos principais.

Eu arriscaria dizer que uma Igreja Batista Reformada pode ser mais do que está aqui, mas não menos. Algumas de nossas igrejas podem cantar exclusivamente Salmos enquanto outras são completamente comprometidas com os hinos. Home-schooling ou escola pública e muitas outras preocupações são problemas a serem solucionados com prudência Cristã e caridade (sim, as igrejas batistas reformadas reconhecem adiaphora). Mas para nosso pequeno grupo de igrejas, estes "Cinco Pontos" estão fora de discussão.

Os cinco pontos das Igrejas Batistas Reformadas
Um breve esboço de nossas convicções distintivas
I. REFORMADA
A. Sola Scriptura - A Bíblia é a autoridade completa, fechada e clara em todas as matérias de fé.
B. Solus Christus - Nossa confiança para a salvação está somente em Jesus Cristo.
C. Sola Gratia – a Graça assegurou a redenção sem referência a obras.
D. Sola Fide - Somos declarados justos por Deus somente pela fé [1].
E. Soli Deo Gloria – A finalidade da criação e redenção é a glória de Deus.

II. CALVINISTA
A. Depravação total - A queda de Adão afetou a totalidade da pessoa do homem [2].
B. Eleição incondicional – A Eleição não é baseada na presciência da fé ou em obras [3].
C. Expiação limitada – A redenção foi obtida por Cristo para os eleitos [4].
D. Graça irresistível – A regeneração pelo Espírito santo é eficaz para os eleitos.
E. Perseverança dos Santos - Deus vai, pela graça, completar o que Ele começou na regeneração.

III. PURITANA
A. Piedade na Adoração - Princípio Regulador do Culto [5], o Dia do Senhor como um Sabbath Cristão.
B. Piedade na Pregação - Primazia da pregação. Ênfase na exposição e na aplicação.
C. Piedade na Instrução - Confessional e católica. Propagar aquilo que nós cremos que a Bíblia ensina [6].
D. Piedade na Família - Pais devem instruir (catequizar) e disciplinar os seus filhos no Senhor.
E. Piedade no Comportamento - Manter uma boa consciência diante de Deus e dos homens.

IV. PACTUAL
A. Unidade da Bíblia - Muitas partes, mas uma só mensagem.
B. Interpretação Cristocêntrica - a pessoa de Jesus, Sua obra e Seu reino, é o tema da Bíblia.
C. Distinção entre Lei / Evangelho – A Lei [7] ordena e condena. O Evangelho salva [8].
D. Um meio de salvação - Cristo salvou todos os eleitos ao longo de todas as eras.
E. Visão otimista da história - Jesus Cristo é agora Rei, reinando sobre todos. Ele virá em breve.

V. BATISTA
A. Prática Eclesiástica Bíblica – Ordenanças só para crentes [9]. Disciplina da igreja exercida com amor.
B. Liberdade Eclesiástica Bíblica - O estado não deve intrometer-se em assuntos da consciência.
C. Governo de Igreja Bíblico - Presbíteros e diáconos. A congregação local escolhe seus líderes [10].
D. Crescimento de Igreja Bíblico - Proclamação do Evangelho para o mundo. Arrependimento e Fé exigidos de todos.
E. Ministério Eclesiástico Bíblico - Sacerdócio de todos os crentes [11].


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[1] Esta é uma justiça imputada externa. A justificação é perfeita, nem crescente, nem minguante.
[2] Nós concordamos com Martinho Lutero que a vontade do homem "vem do diabo e de Adão."
[3] Uma compreensão calvinista da salvação: Nós rejeitamos todo o entendimento antropocêntrico da salvação.
[4] "Ela dará à luz um filho e lhe porás o nome de Jesus, porque ele salvará o seu povo dos pecados deles." Mt 1:21 cf. Jo 10:11,14-18,24-29; At 20:28; Is 53.
[5] Em vez do "Princípio Normativo" que estabelece que o que não é proibido, é permitido. Nosso culto de adoração é constituído ao redor das Escrituras lidas, pregadas e cantadas.
[6] Nós aderimos à Segunda Confissão de Fé Batista de Londres de 1689. Adicionalmente, os credos apostólico, niceno, atanasiano e calcedoniano expressam nossa compreensão de ortodoxia.
[7] Nós reconhecemos os "três usos da lei". Primeiro, a lei serve como um guia para a sociedade promovendo a retidão cívica. Secundariamente, a lei condena os pecadores e os dirige a Cristo. E em terceiro lugar, a lei dirige os cristãos para um viver santo.
[8] A Lei e o Evangelho encontram-se tanto no Antigo como no Novo Testamento. O Evangelho são as promessas de Deus aos Seus eleitos.
[9] O batismo infantil é estranho à prática do Novo Testamento. Da mesma forma, a imersão é o modo apropriado de batismo.
[10] "Uma igreja local, reunida e completamente organizada de acordo com a mente de Cristo, consiste de oficiais e membros. Os oficiais designados por Cristo serão escolhidos e consagrados pela igreja congregada". Nós não reconhecemos nenhuma autoridade maior que a igreja local.
[11] A igreja local é uma família espiritual em que as relações devem ser abertas e honestas. Todos os assuntos são tratados com caridade e paciência. Somente com a participação de todos os membros os indivíduos podem crescer em graça e amor.


Fonte: Extraído do blog da Reformed Baptist Fellowship
Tradução: Juliano Heyse
e-mail:seminaristadovalle@gmail.com

quinta-feira, 27 de maio de 2010

O que queremos dizer por Batista?


O nome “Batista” é, para nós, uma forma abreviada e proposital para transmitir certas verdades. Primeiramente, queremos afirmar as verdades bíblicas com referência àquelas que devem ser batizados e, ao mesmo tempo, a maneira ou método do batismo.


A Bíblia não é silenciosa nem tampouco obscura quanto a esta questão. O fato de ser o batismo exclusivo para aqueles que são discípulos, é um ensino claro e indisputável na palavra de Deus ( Mateus 28.19). O mandamento sobre quem deve ser batizado não se descobre no livro de Gênesis, e sim nos evangelhos e nas cartas apostólicas. Não existe nenhuma evidência na palavra de Deus que possa, legitimamente, sustentar a noção de que os infantes de pais crentes devam ser batizados. Todo mandamento bíblico em particular, assim como todo exemplo e toda afirmação bíblica concernente aos candidatos ao batismo, atestam que estes devem ser somente aqueles que são convertidos.

No que concerne a forma ou método do batismo, este é, própria e biblicamente, administrado por imersão. A palavra grega comum para “imergir” ou ”mergulhar” é a palavra usada em todo o novo testamento. O argumento de que a palavra pode ser encontrada em raríssimas ocasiões significando ”derramar” ou “aspergir” é, diríamos pedir muito. Existem palavras gregas que exprimem perfeitamente o sentido de “derramar” ou “aspergir”. De fato, existem numerosas ocasiões na septuaginta ( tradução grega do antigo testamento) onde as palavras “imergir” e “apergir” são usadas no mesmo contexto, porém, com significados distintos e separados, como as ocasiões onde o sacerdote “molha”(mergulha) o dedo no sangue e o “asperge” sobre o objeto.


O Nome Batista é, em segundo lugar, usado para transmitir nossa persuasão de que somente aqueles que são genuinamente convertidos e batizados têm o direito a membresia na igreja de Cristo. A isto frequentemente aludimos como “membresia regenerada”. Uma leitura cuidadosa das epistolas do Novo Testamento demonstrará que os apóstolos presumiram serem os seus leitores,“santos”, “irmãos fieis” e limpos por Cristo” (I Cor 1.2; Cl 1.2). Infelizmente, em nossos dias muitas são as igrejas batistas que estão mas ocupadas em ter uma membresia de pessoas que fizeram “decisões”, ou uma membresia batizada, ( Lideres querendo lotar banco ou falar que é uma igreja crescente em números ou uma igreja de quantidade, batizando tudo que vem pela frente – palavras minhas) do que com uma membresia regenerada. É dever dos Pastores, como de todos aqueles que pertencem a igrejas verdadeiras, se assegurarem o melhor possível, de acordo com suas habilidades, que nenhuma pessoa não convertida ou começando no evangelho sem entendimento Bíblico venha a tornar-se membro de suas igrejas.



Igreja Batista da Graça
Adaptado com permissão de um sermão pregado por Jim Savastio, Pastor na igreja Batista Reformada de Louisville, Kentucky, EUA.

domingo, 18 de abril de 2010

A Biblia e a Predestinação - A Perseverança dos Santos

Todo aquele que o Pai me dá, esse virá a mim; e o que vem a mim, de modo nenhum o lançarei fora. Porque eu desci do céu, não para fazer a minha própria vontade, e sim a vontade daquele que me enviou. E a vontade de quem me enviou é esta: que nenhum eu perca de todos os que me deu; pelo contrário, eu o ressuscitarei no último dia. De fato, a vontade de meu Pai é que todo homem que vir o Filho e nele crer tenha a vida eterna; e eu o ressuscitarei no último dia. (João 6:37-40)

Hoje em dia conhecemos dois tipos de evangélicos Praticantes e os não-praticantes, também conhecidos como desviados. Pessoas que freqüentaram igrejas, foram batizadas, mas abandonaram a fé ou vivem de modo contrário a ela. E há uma angústia enorme quanto à salvação dessas pessoas. Afinal, se elas morrerem hoje, vão ou não ao céu?

Responder a esta pergunta não é fácil. Mas antes de chegarmos lá, precisamos compreender uma doutrina: a da perseverança dos santos.

Os dois lados do ringue
Uma vez adquirida a salvação, ela pode ser perdida por causa de algum pecado? Segundo os calvinistas (ou reformados), a resposta é não. O verdadeiro salvo perseverará no caminho do Senhor até o fim. Ainda que ele se decepcione com Deus e com a Igreja, essa decepção nunca se transformará em uma apostasia, ou seja, jamais o verdadeiro salvo chegará a perder a sua fé em Deus. Essa doutrina é conhecida como a perseverança dos santos, e é o último ponto do calvinismo.

Os arminianos pensam diferente. Para eles, a salvação pode sim ser perdida. Se um salvo peca e não tem tempo de confessar o seu pecado e arrepender-se dele, ele irá ao inferno. Essa doutrina tem sido básica em muitas igrejas, notadamente algumas de cunho neopentecostal fortemente ligadas às doutrinas do G-12 e de batalha espiritual.

Uma acusação arminiana ao calvinismo é de que a perseverança dos santos induz os salvos ao relaxamento moral. Ao afirmar a salvação como uma graça eterna, o calvinista induziria os cristãos a darem ao pecado um valor menor que o real e a superestimar a graça divina, produzindo uma igreja de desviados.

A minha acusação como reformado é um pouco mais pesada: o ponto de vista arminiano torna Jesus Cristo um Filho desobediente ou incapaz de cumprir a vontade do Pai. Se a perseverança dos santos não é real, há um conflito na Trindade e não seria exagero negar a divindade do próprio Cristo.

O ensino de Jesus
Analisemos o versículo do inicio do texto vejamos o que diz Jesus no texto. Algumas afirmações não podem passar despercebidas:

1) Todo o que o Pai dá a Jesus, vai até Ele. Esse ponto é mais desenvolvido sobre a graça irresistível.

2) Jesus não lança fora os que vão até Ele. Essa promessa é reforçada pela expressão "ou mê", que é traduzida como "nunca" ou "de modo nenhum". Em outras palavras, não há uma possibilidade pela qual Jesus venha a rejeitar os que Ele recebe do Pai. Se Jesus rejeitar um só destes, Ele mentiu e já não merece ser chamado de Deus.

3) A vontade do Pai é que nenhum eleito se perca. Deus Pai deseja que todo homem que veja o Filho e creia n'Ele tenha a vida eterna. Todos, sem exceção. Ele dá pessoas ao seu Filho e não quer que o seu presente seja desperdiçado. Repare, no entanto, que o texto não diz que a vontade do Pai é salvar a todas as pessoas, mas apenas um grupo de pessoas: os que Ele deu ao Filho, que são os mesmos que veem a Jesus e n'Ele creem.

4) Jesus vem cumprir a vontade do Pai. Salvar a humanidade, ensinar, curar...tudo isso pode ser resumido em uma única intenção de Jesus: fazer a vontade de seu Pai. De fato, esse objetivo era tão forte que Ele disse que eram a Sua comida (João 4:34). Repare que Jesus coloca sobre Ele mesmo a responsabilidade de guardar os salvos. Se eles não se perdem é porque Jesus cumpre a vontade do Pai e não perde os Seus filhos.

Mas, e os desviados?
Há duas possibilidades. A mais benigna é a de que pode ser que o "desvio" seja algo passageiro, que o cristão se arrependa e volte à comunhão com o Senhor. É isso o que parece ter acontecido com um membro da igreja de Corinto:
Ora, se alguém causou tristeza, não o fez apenas a mim, mas, para que eu não seja demasiadamente áspero, digo que em parte a todos vós; basta-lhe a punição feita pela maioria. De modo que deveis, pelo contrário, perdoar-lhe e confortá-lo, para que não seja o mesmo consumido por excessiva tristeza. Pelo que vos rogo que confirmeis para com ele o vosso amor." (2 Coríntios 2:5-8)
Por outro lado, é possível que, na verdade, o desviado jamais tenha sido salvo. Na parábola do trigo e do joio, Jesus afirma que tanto o trigo (filhos de Deus) como o joio (filhos do diabo) crescem juntos no mundo (o que, certamente, inclui também as igrejas). Salvos e não-salvos vivem lado a lado e nem sempre é possível distinguir um do outro:
Não! Replicou ele, para que, ao separar o joio, não arranqueis também com ele o trigo. Deixai-os crescer juntos até à colheita, e, no tempo da colheita, direi aos ceifeiros: ajuntai primeiro o joio, atai-o em feixes para ser queimado; mas o trigo, recolhei-o no meu celeiro. (Mateus 13:29-30)
Todos os versículos de advertência quanto a uma possível perda de salvação devem ser lidos tendo essa parábola em mente. Os apóstolos escreviam a igrejas onde trigo e joio convivem lado a lado. As ordens de perseverar servem para encorajar os salvos a permanecerem na fé e para evidenciar as pessoas que não são filhas de Deus:
Eles saíram de nosso meio; entretanto, não eram dos nossos; porque, se tivessem sido dos nossos, teriam permanecido conosco; todavia, eles se foram para que ficasse manifesto que nenhum deles é dos nossos. (1 João 2:19)
Uma advertência final
A perseverança dos santos não é, de modo algum, uma licença para pecar. Nem ela e nem a doutrina da predestinação. O verdadeiro cristão se santifica à medida que o tempo passa, enquanto os condenados ao inferno permanecem no pecado. Um versículo de Apocalipse esclarece bem isso:
Continue o injusto fazendo injustiça, continue o imundo ainda sendo imundo; o justo continue na prática da justiça, e o santo continue a santificar-se. (Apocalipse 22:11).


O santo persevera na santidade e não no pecado.

segunda-feira, 22 de março de 2010

DEUS É INJUSTO?

"Há injustiça da parte de Deus?" Rm 9:14

Muitos tem dificuldades em aceitar algumas afirmações da Bíblia, pois entendem que se forem tomadas em seu sentido natural fazem de Deus injusto. As que tratam da eleição soberana são as que mais trazem dificuldades aos cristãos sinceros, preocupados em resguardar o Senhor da acusação de ser injusto.

A pergunta acima bem poderia ter sido feita por um desses crentes. Paulo citou as palavras de Deus: "Amei Jacó, porém me aborreci de Esaú" (Rm 9:13). O senso comum é que Deus ama a todos os homens de igual maneira, portanto Ele afirmar que amava uma pessoa e se aborrecia de outra deporia contra a retidão de Seu caráter.

Quem conhece a história dos dois personagens sabe que, pela régua humana, se Jacó não fosse muito pior que Esaú, com certeza não seria o melhor dos dois. Desde o seu nascimento, passando pelo episódio da venda da primogenitura e chegando ao roubo da bênção paterna, Jacó era o típico aproveitador desonesto. Como poderia Deus amá-lo enquanto preteria seu irmão Esaú? Para piorar, há o momento em que essa escolha se deu. Paulo diz que "ainda não eram os gêmeos nascidos, nem tinham praticado o bem ou o mal" (Rm 9:11) e Deus já manifestara à mãe dos garotos que "o mais velho será servo do mais moço" (Rm 9:12). Portanto, Paulo sabia que ouviria a acusação de injustiça contra Deus. Mas sua resposta é um enfático "de modo nenhum!" (Rm 9:14).

Como pode ser isso, se Deus amou a Jacó e odiou (este é o sentido exato da palavra no original) Esaú? A palavra chave para resolver o problema é misericórdia, que garantiu que "o propósito de Deus, quanto à eleição, prevalecesse, não por obras, mas por aquele que chama" (Rm 9:11). Deus diz "terei misericórdia de quem me aprouver ter misericórdia e compadecer-me-ei de quem me aprouver ter compaixão" (Rm 9:15).

Para dissipar qualquer nuvem que paire sobre o caráter de Deus, é preciso entender o que é justiça e o que é misericórdia. Justiça é dar a cada um o que é devido e como ninguém merecia a salvação, se Deus condenasse a todos, não seria nem um pouco injusto. Por outro lado, graça e misericórdia é dar a alguém aquilo que ele não merece. Como ninguém tem direito à misericórdia, não pode acusar Deus de injustiça. Por ser a eleição graciosa, os eleitos não tem do que se vangloriar, pois não mereceram a graça, nem os que foram preteridos podem reclamar, pois não tiveram direitos violados.

Portanto, Deus é misericordioso com muitos sendo justo com todos.

sábado, 6 de março de 2010

Amilenismo

A palavra amilenismo significa literalmente “nenhum milênio.” Estritamente falando, não é o caso do amilenismo não ensinar nenhum milênio de forma alguma. A verdade é que o amilenismo não crê num milênio literal e futuro.

O amilenismo ensina que o milênio de Apocalipse 20 é toda a era do Novo Testamento, desde a primeira vinda de Cristo até o fim do mundo. Portanto, os mil anos de Apocalipse 20 devem ser entendidos simbolicamente, e não literalmente.

Este ensino é baseado, primeiro, no fato que os números na Escritura, incluindo o número mil, são frequentemente simbólicos ao invés de literais. Um bom exemplo é o Salmo 50:10, onde a Escritura certamente não quer dizer literalmente e somente “mil montanhas,” mas todas as montanhas.

Visto que a prisão de Satanás é uma das principais características deste período de mil anos (Apocalipse 20:1-3), o amilenismo ensina que Satanás está preso por toda a era do Novo Testamento. Ele não está completamente preso, mas preso somente “para que mais não engane as nações” (Apocalipse 20:3, ARC). Ele está preso, em outras palavras, para que não possa impedir o evangelho de ser pregado e resultar na conversão das nações gentílicas.

Que Satanás estava preso no tempo da primeira vinda de Cristo é claro a partir de Mateus 12:29. Ali, numa referência óbvia à Satanás, Jesus usa a mesma palavra grega para amarrar que aparece em Apocalipse 20:2. Ele diz aos fariseus que “o homem valente [Satanás]” deve ser amarrado. No contexto desta declaração, Jesus está falando da vinda do reino através da reunião dos gentios, mediante a pregação do evangelho (Mateus 12:14-21, 28-30). Mateus 12:29 interpreta Apocalipse 20:2 e mostra que o resultado da prisão de Satanás é o sucesso do evangelho entre as nações no Novo Testamento.

O amilenismo, portanto, não espera um milênio ainda porvir, mas crê que estamos no meio do milênio agora, e que, quando o milênio terminar, o fim do mundo terá chegado. Esta era do Novo Testamento é a última era do mundo.

Os amilenistas não esperam um rapto mil anos antes do fim, nem uma vinda de Cristo mil anos antes do fim, nem esperam que a grande tribulação ocorra mil anos antes do fim do mundo. Antes, eles ensinam que todos estes eventos ocorrerão no fim e serão seguidos pelo estado eterno.

Por isso, o amilenismo ensina que a “trombeta” de 1Coríntios 15:51,52 é a última, e que seguindo o rapto (1Tessalonicenses 4:16,17), os eleitos estarão para sempre com o Senhor na glória celestial. Da mesma forma, no ensino amilenista a grande tribulação de Mateus 24:29 é imediatamente seguida pela trombeta que anuncia a vinda de Cristo na aparição real de Cristo sobre as nuvens e a assembléia dos seus eleitos.

O amilenismo não ensina um período de paz e prosperidade sem precedentes para a igreja antes do fim, mas toma seriamente a verdade bíblica de que a grande tribulação da igreja precederá o final de todas as coisas – que naqueles últimos dias “sobrevirão tempos difíceis” (2Timóteo 3:1), tempos nos quais “os homens perversos e impostores irão de mal a pior” (v. 13).

Por causa disto, alguns acusam o amilenismo de pessimismo. Contudo, ele não é pessimista. Os amilenistas crêem que Cristo reina, e que com poder soberano faz com que todas as coisas, mesmo as tristes, cooperem juntamente para o bem dos seus amados.

Fonte (original): Doctrine according to Godliness, Ronald Hanko, Reformed Free Publishing Association, p. 305-306.

Tradução: Felipe Sabino de Araújo Neto / felipe@monergismo.com